O
ano de 2017 começou muito bem para o setor externo da economia
brasileira, com um saldo positivo de 7,3 bilhões de dólares na balança
comercial no primeiro bimestre, o maior já registrado no período
desde 1989. Esse superávit é decorrência do aumento no preço das
commodities no mercado mundial. Em decorrência, o Índice Bovespa
cresceu 41,5% nos últimos 12 meses, valor muito acima dos mercados
acionários de outros países. Somente as ações da Vale do Rio Doce
tiveram um aumento de 149%.
Esse
saldo positivo, além de ajudar na recuperação econômica,
enfraquece o lulismo. Muita gente ainda acredita que o bom
desempenho da economia no governo Lula foi fruto de uma política
muito bem conduzida pelo então presidente. Na verdade, o fator
essencial foi a situação externa favorável. É bem mais fácil
navegar quando os ventos estão soprando a favor. Esse caso lembra inclusive
outro não tão conhecido. Em 1979, durante o governo Figueiredo, o
então super ministro Delfim Netto foi reconduzido à pasta da
Fazenda. Sua missão era reeditar o Milagre (1968-73). Com um cenário
internacional completamente desfavorável, Delfim conseguiu somente
gerir a crise. Ou seja, em economia, ninguém tira coelho de cartola.
O
superavit comercial no primeiro bimestre de 2017 nos mostra o quanto
a economia brasileira ainda depende da exportação de produtos
primários. No final dos anos 1940, o economista argentino Raúl
Prebisch (1901-1986) argumentou que essa dependência era o maior
entrave para o desenvolvimento da América Latina. Até esse ponto, a
análise de Prebisch estava correta. Todavia, ele argumentava também
que a solução para o subdesenvolvimento latino-americano estava na
industrialização colocada em prática mediante protecionismo
comercial. Esse modelo ficou conhecido como industrialização por
substituição de importações. Décadas de protecionismo comercial
reduziram o grau de eficiência das economias latino-americanas em
geral: preços altos, produtos de má qualidade e concentração de
renda.
Raul Prebisch
Possivelmente,
Prebisch foi influenciado pelo economista alemão Friedrich List
(1789-1846) e sua argumentação acerca da proteção à indústria
nascente. Convém ressaltar que não existe uma teoria do
protecionismo, o que nós temos são apenas argumentações. A
argumentação de List é relativamente simples. No início do século
XIX, a Alemanha era muito atrasada em relação à Inglaterra. List
argumentava que a indústria alemã era nascente e que deveria ser
protegida. Ele não era contra o livre comércio, mas entendia que
esse poderia ser benéfico apenas para países com o mesmo grau de
desenvolvimento econômico. O livre comércio entre países com
níveis de desenvolvimento tão díspares iria simplesmente perpetuar
essa assimetria. Durante anos, professores de Economia no Brasil
ensinaram a seus alunos (inclusive a mim) que a indústria brasileira
deveria ser protegida por ser nascente. Contudo, as primeiras
fábricas brasileiras remontam a meados do século XIX, penso que
chamá-las de nascente é um exagero. Muitos países altamente
competitivos têm indústria muito mais jovem.
Friedrich List
Outro
argumento muito defendido pelos protecionistas é que o tão bem
sucedido modelo asiático de desenvolvimento envolve, além de
práticas protecionistas, um forte apoio do governo ao setor privado.
Particularmente, entendo que essa promiscuidade entre público e
privado resulta inevitavelmente em concessão de privilégios e
corrupção. O desenvolvimento asiático parece estar muito mais
associado a investimentos em capital humano do que incentivos
distribuídos pelo governo. E nesse quesito o Brasil também não tem
feito sua lição de casa. Não temos uma universidade que figure
entre as 50 melhores do mundo e os resultados das provas aplicadas
pela OCDE (Organização
para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico)
a alunos da educação básica de diferentes países nos coloca
sempre entre os piores colocados. Resumindo, podemos dizer que é bom
termos resultados positivos na balança comercial, mas esse fato
evidencia um grave problema estrutural que tem sido negligenciado há
décadas pelos nossos governantes.
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