Na década de 2000, muita
gente apostava suas fichas na economia brasileira. Em 2001, o economista inglês
Jim O’Neill criou a sigla BRIC – Brasil, Rússia, Índia e China, que mais tarde
se transformaria em BRICS, com a inclusão da África do Sul (em inglês, South
África). Segundo o economista, essas eram cinco nações em desenvolvimento, mas
com potencial de superar as maiores economias do mundo em algumas décadas. Em 2009, a revista britânica The Economist publicou em sua capa uma
imagem do Cristo Redentor como um foguete prestes a alçar vôo. Título da
reportagem: Brazil takes off, ou Brasil
decola, em tradução livre.
Legalizar é a solução
Curiosamente, nessa mesma
época, eu andava pelas ruas do centro de São Paulo e tinha a sensação oposta. A
quantidade de moradores de rua era gigantesca e parecia aumentar a cada dia. Eu
me questionava: como a economia podia estar indo tão bem se a quantidade de
miseráveis crescia a cada dia? Eu me lembro da mesma São Paulo nos anos 1980.
Durante a chamada “década perdida”, em meio à inflação descontrolada,
estagnação econômica e crise do endividamento externo, havia poucos moradores
de rua. Como entender esse aparente paradoxo? Levou um tempinho para eu compreender
o que estava acontecendo. Na década de 1980, não existia o crack. Aquela imensa
horda de miseráveis que se acumulava no centro da cidade era, na verdade,
viciados em crack.
Eu sempre fui um defensor da
legalização plena da produção, comércio e uso de drogas. O surgimento do crack
veio reforçar essa minha convicção. O crack é a cocaína dos pobres e surgiu somente
porque a cocaína custa caro. E por que a cocaína custa caro? Porque é ilegal. A única forma de inibir o
consumo de crack está na completa legalização das drogas.
O meu argumento de que todas
as drogas deveriam ser legalizadas está fundamentado em convicções pessoais de
cunho filosófico e evidências empíricas. Do ponto de vista filosófico, eu acredito
no liberalismo. E, como liberal, eu entendo que o Estado tem suas funções, mas
o Estado não é nosso dono. Não é o Estado que vai nos dizer o que é bom e o que
é mau, qual caminho devemos ou não devemos seguir. Quando uma pessoa decide se
enveredar pelo mundo das drogas, está fazendo uma péssima escolha. Mas essa
decisão deve partir do indivíduo e não do Estado.
Do ponto de vista empírico,
temos de admitir, a repressão ao comércio de drogas falhou em praticamente todo
o mundo. Vamos analisar o caso brasileiro que é o que conhecemos melhor. Vender
drogas pode ser uma atividade altamente lucrativa. Os chefões do tráfico têm
muito dinheiro e com esse dinheiro compram armas potentes. E com essas armas podem
enfrentar a polícia de igual para igual. Nessa guerra, morrem policiais,
bandidos e pessoas que nada têm a ver com a história. Virou rotina,
principalmente no Rio de Janeiro, pessoas serem atingidas por bala perdida.
Uma outra contradição é: por
que algumas drogas são legalizadas e outras não? Por que cigarros e bebidas
alcoólicas são comercializadas livremente enquanto a maconha continua ilegal? A
nicotina dos cigarros é muito mais viciante que o THC da maconha. Acredito que
uma pessoa alcoolizada ao volante é algo mais perigoso que outra que tenha
fumado um “baseado” ou até mesmo usado cocaína.
Outro mito é que a maconha é
a porta de entrada para drogas mais pesadas. Isso é uma bobagem. Eu tenho
vários amigos que apreciam álcool, mas não fumam. Conheço várias outras pessoas
que fumam, mas não bebem. E já conheci pessoas que usavam maconha e não bebiam
nem fumavam. Gostar de consumir um tipo de droga não significa gostar de
outras. Além disso, não existe essa escadinha das drogas mais leves para as
mais pesadas. E todo mundo que está no primeiro degrau da escada vai querer
subir até o topo.
Imagine um mundo sem
repressão às drogas. Os traficantes desapareceriam. Com o fim do tráfico, os
bandidos teriam menos dinheiro, menos armas e menos condições de enfrentar a
polícia. A guerra contra o tráfico desapareceria, as drogas seriam produzidas
por pessoas comuns que trabalham e pagam impostos. Muitas vidas seriam
poupadas. Existe apenas um ponto negativo em liberar o comércio de drogas. Se
as drogas se tornarem mais baratas e acessíveis, provavelmente o consumo irá
aumentar. Isso não é bom. Mas, conforme disse anteriormente, essa é uma decisão
pessoal. Drogas podem destruir a vida de uma pessoa. Eu não fico feliz ao ver
alguém com a vida destruída por causa do vício em drogas. Porém , mais
triste que isso são as pessoas que nunca usaram droga e estão morrendo pela
repressão ao consumo.